quinta-feira, 28 de outubro de 2010

FIM DA LINHA

( 31 de Outubro, Dia das Bruxas. Eu não acredito, mas que elas existem, existem! Vocês creem em destino? Adivinhos, astrólogos, ciganos, cartomantes... )


          Parece que os pais dele adivinharam quando escolheram seu nome: Glicério era o cara mais sério de que se tem notícia. Compenetrado, respeitador e econômico. Como não casou e não tinha mais família, dedicou-se com tal afinco ao trabalho, que ninguém no escritório conseguia tirá-lo da linha. Nada de conversa fiada, paqueras ou chopinhos depois do expediente.

          Isso foi até a festinha de amigo oculto do último fim de ano. Glicério ganhou um livro da colega Helena, mas não houve interesse em se saber qual era o título. O presente estava bem de acordo com ele. Quando voltaram das férias coletivas, o homem era outro. Os adjetivos que o qualificavam mudaram para brincalhão, paquerador e esbanjador. Não livrava nenhuma cara nas suas brincadeiras, nem a do patrão. Azarava até a senhora que fazia a faxina. E as happy-hours eram diárias e prolongadas.

          No início, todos gostaram da transformação, mesmo sem entender o porquê. Depois, os colegas começaram a se preocupar. Glicério caiu na esbórnia, exageradamente, com risco de perder o emprego. O patrão levava em consideração os quase trinta anos de bons serviços, mas estava ficando demais. Até que criaram coragem e foram falar com ele:

          - Menos, Glicério. O que está havendo?

          Já ligeiramente alcoolizado, respondeu:

          - Foi aquele livro que a Helena me deu. Mudou minha vida. Hic... Uma vez, me falaram: "Não leve sua existência tão a sério porque você não vai sair dela com vida.". Eu não levei a sério. Quá, quá, quá...

          O colega argumentou:

          - Tudo bem, mas você está indo longe demais.

          - Longe? Hic... Meu fim está perto mesmo.

          A confusão se instalou na cabeça deles. Fim? Livro? Ele explicou:

          - "Aprenda a Ler Mãos". Li e vi que a minha linha da vida é curta. Então...

          Helena sentiu-se culpada. Gostava de assuntos esotéricos e deu o livro para ele de brincadeira. Tentou consertar:

          - Glicério, calma, não leve tão a sério. Você pode não ter lido direito.

          - É curta, sim, olha aqui!

          - Glicério, esta não é a linha da vida, é a da inteligência.

          Ele levantou-se, fixou os olhos nos colegas, que prendiam o riso, e balbuciou:

          - Ah, é? Graças a Deus!

          Voltou a ser o mesmo Glicério de antes, compenetrado, respeitador, econômico. E sério.
         

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

O JULGAMENTO

( Nesta semana, dia 18, tivemos o Dia do Médico. Salvadores de vidas e da pátria, merecem todas as homenagens dos pacientes. Para não haver ciúmes, aproveito para saudar os Dentistas pelo dia 25, na próxima semana. O texto serve para  puxar o saco de ambos os profissionais. )


          Processo nº 12 / 10 / 2010

          Promotor: a mãe
          Réu: o filho de três anos
          Advogado de defesa: a avó
          Juiz: o médico pediatra
          Acusação: crime de só comer alimentos que fazem mal à saúde

          Tem a palavra a Acusação:

          Mãe: - Doutor, este menino está um problema para comer. Não gosta de nada. A nossa empregada é testemunha. E nós não podemos permitir que a alimentação dele seja composta de doces, frituras e refrigerantes.

          Avó: - Protesto! Você está esquecendo que já foi criança. Quando tinha a idade dele, só queria isso, também. E, além do mais, não é todo dia. É apenas nos dias em que eu e seu pai visitamos vocês. Vamos levar o que para ele? Feijão, mingau, ensopadinho???

          Mãe: - Acontece que vocês visitam o seu neto quase todo dia. A partir de agora, ele terá que comer de tudo que é saudável.

          Avó: - Mas essa pena é muito rigorosa! Ele tem direito a umas balinhas, pelo menos.

          Criança: - Mãe, eu tô com fome!

          ( O médico tinha uns pirulitos para oferecer, mas achou melhor "esquecer". )

          Mãe: - Pegue o pacote de biscoito de chocolate na minha bolsa, filho.

          Avó: - Biscoito? E nós é que estragamos esta criança... Viu, doutor, por isso é que ele não almoça nem janta direito.

          Mãe: - Mas é que hoje é um dia atípico. A culpa é da hora da consulta. Era às onze, mas só agora fomos atendidos.

          ( O médico, no meio do fogo cruzado, viu que acabaria sobrando para ele, tão inocente nessa história. Pensou até em empurrar o litígio para o dentista. )

          Médico: - Silêncio no consultório! Ou mandarei evacuar o recinto.

          Mãe: - Então, doutor, qual o seu veredicto?

          Médico: - Tanto a acusação quanto a defesa, quer dizer, a mãe e a avó, apresentaram uma argumentação convincente. A minha decisão é que o acusado, desculpem, a criança, deve comer, diariamente, o que os pais determinarem. E, nos fins de semana, está livre para saborear as delícias, er, as bobagens que os avós compram. Declaro encerrada a consulta!

          ( Depois que todos saíram, o médico lembrou que já estava quase na hora do seu plantão no hospital e ainda não tinha almoçado. Pegou os pirulitos que iria dar para o garotinho e foi saboreando no carro. )          
         

sábado, 16 de outubro de 2010

BICHO TAMBÉM É CULTURA

( Ontem foi Dia do Mestre, meu dia! Olha eu dando aula! Até bicho já levei para a sala. Professor se vira nos 30 porque o salário, ó ... )


          Um escritor, ao fazer sua obra, seja em prosa ou em poesia, pode lançar mão de recursos que embelezam e enriquecem, tornando especial o texto: são as Figuras de Linguagem. Ao usá-las, o autor joga com a conotação das palavras, o sentido figurado, ao contrário da denotação, o sentido verdadeiro. Vejamos o caso da palavra "ossos". Na frase "Ele quebrou os ossos da perna no acidente." , ela está no sentido denotativo (partes da estrutura do corpo humano). Porém, nesta outra "São os ossos do ofício." , está no sentido conotativo (dificuldades, problemas). Isto quer dizer que é preciso usar a imaginação ao recorrer às Figuras.

          Uma das Figuras mais importantes e, sem dúvida, a mais usada, é a Metáfora. Por isso, pode ser considerada o Flamengo das Figuras. Ela é baseada numa Comparação; a diferença é que esta última é mais direta, mais explicativa: "Minha casa é grande como um castelo." Enquanto a frase metafórica obriga o leitor a raciocinar, a buscar um entendimento: "Minha casa é um castelo." Ou seja, é uma figura cheia de mistérios e sutilezas, tem mais charme.

          Bichos são muito utilizados tanto na linguagem do dia-a-dia como na literária, seja lírica (minha pombinha!) ou pejorativa (seu cachorro!). Metaforicamente, muitos animais podem entrar nas sentenças, comprovando uma opinião ou atestando uma intenção, uma ação. A própria palavra BICHO já demonstra isso: "Meu avô é o bicho!" porque o neto acha que ele é uma pessoa legal; e "Vou virar bicho!" porque a pessoa pretende brigar ou discutir por algum motivo.

          E há também os casos das Metáforas com os nomes dos animais, cuja ideia pode ser positiva ou negativa. "Joana está uma gata." (bonita) ou "Meu irmão é um porco." (sujo).

          Vamos lembrar outros exemplos? (Será que alguém não entendeu?)

domingo, 10 de outubro de 2010

MONÓLOGO DO LOBO ( MAU ? )

( A famosa história do Chapeuzinho Vermelho é contada exatamente como aconteceu? Qual será a versão verdadeira? )


          Vocês são muito engraçados!

          Acreditam em qualquer coisa que contam e nem procuram conhecer o outro lado. Por isso é que estou aqui preso, morrendo de fome, enquanto eles vivem felizes para sempre. E os meus direitos? Cadê a justiça?

          Pra começar a minha versão daquela história boba, me jogaram numa floresta, sem nada para comer. Não tinha dinheiro, logo, eu tive que me virar. Avistei uma casa, onde uma mãe pedia à filha que levasse uma cesta cheia de doces, pães e frutas para a avó que estava doente. Ô mulher chata! Ainda recomendou que ela fosse pelo caminho mais longo e movimentado, pois havia um lobo horrível solto por aí. Audácia da Filombeta! Horrível era ela! Ah, e a roupa da garota? Uma capinha com capuz vermelho. Que coisa ridícula!

          Quando ela começou a cantar, com aquela voz de taquara rachada, : "Pela estrada afora, eu vou tão sozinha, levar estes doces para a vovozinha...", pensei:  MEU OUVIDO NÃO É PENICO! Saí correndo pela floresta e me deparei com uma casa. Bati, mas ninguém respondeu. Reparei que a porta estava apenas encostada. Deram mole, entrei. Comecei a procurar algo para comer. De repente, uma voz esganiçada quase me matou do coração: "Um lobo! Socorro!" Era uma velha toda encarquilhada. Não conhece cirurgia plástica nem botox, minha filha? Peguei a coroa e tranquei no armário, amarrada e amordaçada.

          Foi quando escutei uma batida na porta e reconheci AQUELA voz: "Vovó, sou eu, Chapeuzinho Vermelho, posso entrar?" O único jeito foi deitar na cama da velha e me cobrir. Não é que a burra da garota achou que eu era a avó? E começaram as perguntas idiotas: "Vovó, por que estas orelhas tão grandes?" Afinei a voz e fui respondendo:: "São pra te escutar melhor, minha netinha." "Vovó, por que estes olhos tão grandes?" "São pra te enxergar melhor, minha netinha." "Vovó, por que este nariz tão grande?" Ela não parava, ô inferno! "São pra te cheirar melhor, minha netinha."

          Ah, mas quando ela perguntou "Vovó, por que esta boca tão grande?", não deu pra segurar, pulei da cama e berrei: "É pra te comer!"

          Só que a mala da guria berrava também, uma histérica. Olhem a coincidência: na hora, um caçador passava por aquele fim de mundo. Entrou, apontou uma arma para mim e disse: "Perdeu! Escolhe: ou morre ou vai preso." Adivinhem o que eu escolhi... Ah, e o encontro das duas mocreias? Choravam mais que atriz de novela mexicana.

          Tentei explicar que o que eu queria não era aquela velha enrugada ( argh! ) nem aquela garota pentelha (eca! ), mas ele me deu uns cascudos e me prendeu.

          Gente, o que eu queria era a cesta com aquelas coisas apetitosas. Eu sou vegetariano! E eles só me trazem pedaços de carne sangrenta.

          Depois reclamam que eu estou em extinção...

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

INTERVALO COCÔ - MERCIAL

( Dedico a todos os meus sobrinhos, biológicos e "adotados". Para mim, eternas crianças... )


          A história estava no seu auge: as casas dos dois porquinhos preguiçosos já haviam caído e o Lobo estava se preparando para soprar e derrubar a casa do Prático, pois queria comer todos eles. Quase diariamente e pacientemente, a tia contava as aventuras do Lobo Mau e dos Três Porquinhos para o sobrinho de três anos. Nessa faixa de idade, é a favorita das crianças. Como moravam longe uma do outro, o telefone era o meio que compensava a distância que os separava, com direito a fundo musical ( "Eu sou o Lobo Mau, Lobo Mau, Lobo Mau..." ) e efeitos sonoros para as batidas nas portas ( Bam,bam,bam ! ) e o sopro destruidor do temível personagem ( Fuuuuu ! ).

          O interessado ouvinte nem piscava, atento a todos os detalhes. Caso a tia esquecesse algum, ele corrigia prontamente. E ela se perguntava: "Se sabe toda a história, pra que quer que eu conte?" A resposta, já conhecida, era a maneira que toda criança encontrou para ter a atenção da pessoa querida. Além disso, modéstia à parte, era exímia na arte da narrativa oral.

          Foi quando ele pediu que ela parasse porque queria ir ao banheiro. Ela propôs desligar o telefone e, depois, ligar de novo. O garotinho implorava para  não desligar, talvez, com medo de que a tia esquecesse a promessa ou de que os pais cortassem, no ato, a importante conversação. "Telefone custa caro... não é brincadeira... alguém pode ligar..." A contadora de história, diante de tanta insistência, concordou e aguardou no aparelho. Acontece que o guri estava no telefone sem fio e levou-o para o banheiro, colocando-o perto do vaso sanitário. Tia também padece no paraíso. E ouve:

          - Ããããã... Ããããã... ( Ploft! )  Mãe, acabei!

          Terminados os trabalhos fisiológicos e higiênicos, pegou o telefone e avisou à tia que poderia continuar a história. Após ser obrigada a participar daquelas emissões sonoras ( não basta ser tia ), a coitada nem lembrava mais onde estava. Mas ele sim!

          - O Lobo vai para a casa do Prático, vai soprar, não vai conseguir derrubar, vai subir no telhado, vai entrar pela chaminé... Anda, Tia! Conta!

domingo, 3 de outubro de 2010

LIPPY THE LION AND HARDY HA HA ( A Hanna - Barbera Cartoon )

( Criança lembra desenho animado. Participei da Oficina de Crônicas, na faculdade Estácio de Sá, com o Carlos Eduardo Novaes e suas dicas preciosas: "enxugar o texto para tirar excessos e repetições; dar um tempo de gaveta para melhorar as ideias". Valeu, Mestre! )



          Lippy: - Ei, Hardy!

          Hardy: - O que é, Lippy? Ó dia!

          Lippy: - Hardy, que legal! Essa moça é uma grande fã, somos inesquecíveis para ela. Ainda assiste aos nossos desenhos animados.

          Hardy: - Não sei pra quê. Ó semana!

          Lippy: - Ô amigão, pra se distrair. Desde que era criança até hoje, com mais de cinquenta anos. É sinal de que ela tem a mente jovem.

          Hardy: - De que adianta? O corpo está envelhecendo. Ó mês!

          Lippy: - Hardy, você é uma hiena e, como tal, devia dar valor ao riso. Os médicos dizem que os otimistas vivem mais. Olhe para mim. Por isso, sou um leão forte.

          Hardy: - Rir de quê? A gente está sempre se metendo em encrencas. Ó vida!

          Lippy: - A vida não é fácil, Hardy. Superar as dificuldades é a graça de viver. Essa nossa fã, por exemplo, faz o possível para resolver os problemas, sem aborrecer ninguém. Diz que se identifica comigo, mas, às vezes, tem seus dias de Hardy. Agora, ela resolveu ser escritora. Suas histórias têm muito humor.

          Hardy: - Literatura de humor é besteirol. Isso não dá nem prêmio. Ó drama!

          Lippy: - Hardy, é um grande desafio fazer as pessoas rirem. Conseguir transformar a vida em comédia é divino. Ela fez um curso com o Carlos Eduardo Novaes, um escritor experiente, que orienta para o aperfeiçoamento.

          Hardy: - Curso é perda de tempo e dinheiro. Carlos Eduardo Novaes? Grande coisa! Ainda se fosse o Paulo Coelho... Ó tristeza!

          Lippy: - Anime-se, meu amigo! O importante é que ela faz o que gosta. Nunca é tarde para começar. Quem sabe não conseguirá a publicação dos textos ou algum trabalho ligado a eles?

          Hardy: - Vai arrumar ideia de ser mal interpretada e considerada alienada. Os editores vão ignorar e ninguém vai achar graça. Isso não vai dar certo. Ó azar!

                                                  THE  END

Setembro/Outubro

          Setembro bombou! A safra foi de 10 textos, incluindo a apresentação do blog, e 2 comentários sobre o andamento do mesmo. Para o primeiro mês, está bom, né?  Em outubro, teremos criança, professor, médico... Todos festejados pelo seu dia, com diferentes histórias.