quarta-feira, 29 de setembro de 2010

A MULHER INVISÍVEL

( Loucuras são feitas na busca pela melhor aparência. As aparências enganam... )


          O anúncio no jornal parecia bem atraente: "Redefina sua expressão com a pigmentação de sobrancelhas. Você será notada e admirada." A mulher, à medida que envelhece, perde pelos onde não quer (sobrancelhas) e ganha onde não deve (buço, por exemplo). Estava cansada de passar em branco pelo marido, pelos filhos e por ela mesma. Olhava-se no espelho e não se via, sentia-se invisível. Não podia mais viver do passado, pensando em como era quando jovem. O futuro é agora e depende dos seus próprios atos no presente. Chega de timidez e indecisão! Criou coragem e decidiu-se: marcou hora e foi à luta para mudar de vida.

          No salão, a esteticista avisou que ficaria um pouco escuro nos primeiros dias, mas, depois, a aparência seria bem natural. Convenceu-a a mudar a cor dos cabelos, também. A moda, agora, eram tons avermelhados. Quando tudo acabou e olhou-se no espelho, quase gritou. Suas quase inexistentes sobrancelhas estavam grossas e escuras como breu. E os cabelos, quanta diferença! Não era um tom avermelhado, era o próprio vermelho em pessoa. Sentia-se uma mascote do Flamengo, rubra e negra.

          - É assim mesmo, depois você se acostuma. - consolou a esteticista.

          Envergonhada, botou o casaco na cabeça (que sorte que estava frio!), os óculos de leitura bem colados nos olhos e, sem enxergar direito, saiu tropeçando pela rua. Conseguiu chegar em casa, aos trancos e barrancos. E agora? Sem problema, pensou, são todos uns desligados com ela. Já apareceu engessada, enjoada, encharcada, e eles nada...

          Rezando para ninguém estar, tirou o casaco e os óculos e entrou. Os filhos, dois rapazes, estavam na sala, vendo televisão. Cumprimentou-os, rapidamente. A princípio, eles responderam mecanicamente, como sempre. Mas, logo em seguida, pegaram um pano de cobrir sofá e jogaram na cabeça dela, gritando:

          - Fogo! Fogo! Monteiro Lobato está pegando fogo!

          Teve vontade de incendiar os dois, que rolavam no chão de tanto rir. Foi quando o marido, vindo do banheiro, perguntou que confusão era aquela:

          - Fui ao salão, não está vendo? - berrou furiosa.

          E ele, alienado:

          - Fazer o quê? Fisioterapia?

          Diante das faíscas que ela lhe lançava pelos olhos e pelos cabelos e das gargalhadas dos filhos, ele caiu na real. Preferiu perder a mulher do que perder a piada:

          - Já sei, o salão desabou em cima de você.

          Ela nem respondeu. Que saudade dos tempos em que não era notada... Como viveria dali para a frente? Foi para o quarto e concluiu que não poderia tecer um manto de invisibilidade nem encomendar uma burca. Nada de passado ou futuro, tinha que resolver agora. Botou um vestido bem chamativo, maquiou-se exageradamente e voltou para a sala. Categórica, avisou:

          - Hoje não fiz janta. Vamos comer fora, num restaurante bem badalado. E preparem-se, porque amanhã vou encher a cara de botox!

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